No 17º dia de protestos e em seu último pronunciamento como presidente, Mubarak avisou que ficaria na presidência; menos de 24 horas depois, ele renunciou Foto: Reuters |
Voltaire Schilling
Pela primeira vez desde a queda do rei Faruk, ocorrida em 1952, um governante da república egípcia é obrigado a afastar-se do poder por pressão das ruas. Durante mais de 60 anos nada disto foi possível, nada parecia abalar o poder dos três neofaraós que se sucederam de vinte em vinte anos, até que o 11 de fevereiro de 2011 apeou Hosni Mubarak do poder.
Pareceu-se a uma das tantas cheias do rio Nilo. Durante 18 dias ininterruptos um caudal humano de homens e mulheres de todas as idades ocupou as partes centrais da cidade do Cairo, tornando a praça Tahrir uma imensa ágora do povo egípcio.
Queriam o fim da longa ditadura de Hosni Mubarak e o conseguiram. Fizeram eco aos acontecimentos de Tunis, quando lá uma massa exasperada pelo marasmo do governo de Zein-al-Abidin Ben Ali se insurgiu exigindo renuncia e liberdade. Em quatro semanas de protestos colocaram abaixo um regime que chegara a três décadas.
No Egito foram apenas pouco mais do que duas semanas. Em nenhuma das duas ditaduras houve uma reação consistente que conseguisse deter ou reverter a enorme pressão das ruas. Caíram de cansadas. Nem Ben Ali nem Mubarak tinham qualquer outra coisa a oferecer a uma multidão desanimada e desesperançada.
Nacionalismo sem rumo
Sinalizaram por igual, a falta de rumo do nacionalismo árabe desde que resolveu compactuar-se com os Estados Unidos (o Egito desde 1978, a Tunísia bem antes). O nacionalismo que nascera anti-ocidental, particularmente anti-britânico e anti-francês, e que se radicalizara nos anos 50 do século passado por ser igualmente antissionista, terminou se acomodando.
Numa total girada diplomática determinada em 1972, até hoje bem pouco estudada, o Egito durante o mandato do general Anuar al-Sadat (1970-1981) rompeu estrepitosamente com a URSS e bandeou-se com todas as bagagem para o lado dos Estados Unidos. Posicionamento que causou um enorme choque em todo o mundo muçulmano e que certamente foi responsável pelo assassinato dele por jovens oficiais da Jihad islâmica em 6 de outubro de 1981.
Ainda que os resultados de um acordo com Israel, acertado em Camp David em 1978, foram benéficos para o Egito, pois Sadat conseguiu recuperar os territórios perdidos na Guerra do Yon Kipur (1973) e receber gordos subsídios americanos para suprir suas forças armadas, o regime dos herdeiros de Nasser perdeu sua alma. Tornou-se um nacionalismo sem causa e sem norte, esvaziando assim o templo do poder do seu último faraó.
Fonte: Terra Educação – História