A recente aquisição de 15% de participação na produtora mineira de nióbio Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM) por um grupo asiático é um claro indicativo do interesse que algumas nações têm em matérias-primas estratégicas. Mas o Brasil parece seguir na contramão. Pelo menos em relação às terras raras, conjunto de elementos químicos usados principalmente na indústria de alta tecnologia e que são igualmente estratégicos.
Oficialmente, o País tem menos de 1% das reservas mundiais de terras raras, segundo o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM). No entanto, é consenso entre quem atua na área que essas reservas podem ser bem maiores. “Não há dúvida. O Brasil é uma caixa de surpresas para a mineração”, afirma Romualdo Paes de Andrade, responsável pela parte de terras raras do DNPM. “Há necessidades estratégicas que o Brasil vai ter que colocar em ordem para retomar pesquisas que estavam a pleno vapor há dez anos.”
Terras raras é o nome que se dá a um conjunto de 17 elementos químicos. A maioria das pessoas não conhece os nomes, mas provavelmente já teve contato com algum dos diversos produtos que levam esses minerais. São usados em smartphones, iPods, fibras óticas, supercondutores, baterias para carros híbridos, vidros e lentes especiais, ímãs, refino de petróleo e na indústria bélica, além de vários outros. “Quanto mais os eletrônicos são miniaturizados, mais a indústria precisa desses elementos”, observa o diretor de assuntos minerários do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), Marcelo Ribeiro Tunes.
“Capenga”. O Brasil foi um dos pioneiros na produção de terras raras, iniciada no País ainda no século 19, em areias monazíticas da Bahia, e chegou a liderar a produção mundial nas décadas de 1950 e 1960, posto que dividia com a Índia. No entanto, apesar do uso variado e cada vez mais constante, o governo vem deixando de lado a pesquisa em terras raras desde o regime militar, quando a Nuclemon, subsidiária da Nuclebras, assumiu a exploração do material. “Em 1985, essa exploração já estava capengando. Na década de 1990, parou de vez”, disse Marcelo Tunes.
A paralisação coincidiu com o avanço da China, dona de 57,7% das reservas mundiais conhecidas, que dominou com preços que tornaram a importação do material mais viável economicamente do que sua extração e beneficiamento. “A China investiu na exploração e produção e quebrou os concorrentes”, conta Paes de Andrade. Para se ter uma ideia, a China produziu, em 2008, 120 mil toneladas, enquanto a produção na Índia foi de 2,7 mil toneladas e o Brasil, terceiro maior produtor mundial, produziu 834 toneladas.
No ano passado, porém, o gigante asiático anunciou uma redução de 11,4% no volume de exportação de terras raras, para atrair mais indústrias de ponta para o país. “A China assumiu o monopólio com um objetivo: para comprar os minerais, hoje, tem que ser com valor agregado. Ela reduz o volume de exportação de terras raras, mas quer produzir os produtos que usam os elementos”, acrescenta.
Segundo Tunes, essa medida já levou o governo dos Estados Unidos a estudar a possibilidade de oferecer subsídios para a reativação da mina de Mountain Pass, na Califórnia, também fechada devido à falta de competitividade diante dos preços chineses. Medida que Romualdo Andrade defende também para o Brasil, a exemplo do que ocorre com materiais nucleares como urânio, explorado no País pela iniciativa privada em parceria com o governo. “Esse casamento poderia ser feito também para terras raras. Áreas sem viabilidade econômica (para empresas) poderiam ter subsídio governamental”, avaliou.
Salto. Enquanto o governo titubeia na retomada das pesquisas de novas reservas, empresários se adiantam. E as perspectivas oferecidas pelo crescimento acelerado da indústria de tecnologia atraem pesos pesados para a atividade. Segundo o Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), após a redução das exportações chinesas, o preço da tonelada de terras raras chegou a US$ 50 mil, salto de 1000% em relação aos US$ 5 mil que custava antes. Em 2010, 134 mil toneladas do material movimentaram um mercado de US$ 2 bilhões, valor que tende a crescer.
Numa palestra em Minas Gerais no fim do ano passado, o empresário Eike Batista declarou que estava mapeando algumas áreas. “Terras raras são os metais do futuro”, disse na ocasião. “O Brasil tem um potencial extraordinário, pode competir com a China. Pelo que já sei, nós temos uma reserva maior que a China”, completou. Após o discurso, porém, evitou entrar em detalhes sobre novas reservas.
Uma dificuldade, porém, é o alto do custo dos investimentos para pesquisar e explorar novas reservas. O Ibram defende uma análise mais detalhada do solo por parte do governo, como forma de reduzir os riscos. Segundo Tunes, menos de 30% do território brasileiro tem mapeamento geológico em escala adequada. “No mundo inteiro, essa é uma função de governo e no Brasil não é diferente”, ressaltou.